Anastasis. Crime castigo.
Anastasis traz uma potente e sombria sequência onde adentramos territórios ainda mais densos da espiritualidade, justiça cósmica e da vingança sobrenatural, conduzidos pela figura enigmática e sedutora de Alice — agora, um espírito com contas a acertar.
O retorno de Alice marca o início de uma série de encontros fatais com homens que, em vida, foram marcados por perversões, abusos de poder e omissões morais. Esses capítulos apresentam um tom mais visceral e psicológico, aprofundando-se nas memórias, nos traumas e nas perversões humanas com uma frieza quase clínica, sem abrir mão do lirismo sombrio que caracteriza a narrativa.
O primeiro a ser visitado por Alice é Adelson, um pastor evangélico que converteu-se após uma juventude marcada por abusos e crimes. Contudo, sua redenção escondia um ciclo silencioso de novas violações. Alice, vestida de sensualidade e mistério, manifesta-se através do corpo da jovem Juliana, e o confronto entre o sagrado e o profano culmina em uma morte brutal que parece tão inevitável quanto simbólica — um autojulgamento executado por sua própria consciência, encarnada na figura demoníaca de Alice.
Em seguida, mergulhamos na vida de Jair, funcionário do Senado e produtor amador de filmes pornográficos com menores. Aqui, o horror se torna mais explícito e angustiante. A punição vem de forma poética e cruel: as mesmas fitas que registravam seus crimes tornam-se os instrumentos de sua morte, como se as imagens quisessem cobrar, quadro a quadro, a dor dos corpos violados. A cena de sua morte é tão gráfica quanto simbólica: o erotismo transformado em agonia, o voyeurismo virando o olhar para si mesmo.
Jonas, o terceiro a ser visitado, representa o deboche da elite criminosa, envolvida em festas ilícitas, exploração sexual e fraudes políticas. Em um cenário que mistura hedonismo e decadência, Alice surge como uma figura quase mitológica, em meio a uma festa temática das cavernas, e o transforma em tocha viva, incendiando não apenas seu corpo, mas tudo o que simbolizava sua impunidade.
Por fim, temos o capítulo mais melancólico de Anastasis, o de Antônio, um velho apaixonado por Alice em vida, que envelheceu preso à culpa e ao vazio deixado por sua morte. Aqui, a justiça se manifesta de forma mais sutil e compassiva. Não há horror explícito, mas sim uma lenta e dolorosa dissolução da mente e da identidade — uma espécie de morte em vida, marcada pelo arrependimento e pelo esquecimento.
Nessa sequência de Anastasis, a narrativa atinge um novo patamar de densidade emocional e moral. Alice não é apenas um fantasma ou espírito vingador — ela é o espelho que devolve a imagem real daquilo que os vivos escondem. E com ela, seus julgamentos não seguem as leis humanas, mas sim uma lógica espiritual, instintiva e profundamente justa, ainda que cruel.
As cenas se entrelaçam como pequenos contos de horror moderno, onde cada “cobrança” é também uma revelação. A leitura é incômoda e fascinante, carregada de tensão erótica, crítica social e uma espiritualidade sombria. Alice, nesse retorno, não busca apenas vingar-se. Ela mostra que o além é menos distante do que imaginamos — e que algumas dívidas nunca deixam de ser cobradas.
Assine o blog e acompanhe os posts deste site.
Baixe o ebook clicando aqui.
Você precisa fazer login para comentar.