O retorno de Alice
Em O Retorno de Alice, sequência poderosa da obra Anastasis: Almas Telepáticas, o leitor é lançado num mergulho vertiginoso entre vida, morte e transcendência, onde o tempo se desfaz, os sentidos se tornam inúteis e a alma assume o protagonismo da existência. Narrado por um personagem que já não pertence ao mundo dos vivos, o capítulo se desenrola como um delírio lúcido, recheado de críticas sociais, revelações familiares, e um suspense sombrio sobre culpa, desejo, e redenção.
Darwin, nosso narrador, morto mas onisciente, perambula pelo limiar entre passado e presente na companhia de Death, seu antigo gato – agora um ser espiritual de profunda importância simbólica. Juntos, observam (e influenciam) os acontecimentos que precederam e sucederam a morte de Alice, figura trágica e complexa, que foi babá, amante e pivô silenciosa de dramas familiares e morais profundos. Alice, embora morta, retorna não apenas como presença, mas como força, como ajuste de contas com o passado e seus algozes.
Com narrativa carregada de crítica social e tensão psicológica, o autor expõe o machismo velado da elite brasileira, a hipocrisia moral da classe média tradicional e os abusos sexuais silenciados por décadas. A adoção de Alice, supostamente por benevolência, revela-se instrumento de exploração. Os vizinhos, figuras respeitáveis à luz do dia, tornam-se predadores sombrios à noite. A própria família do protagonista está envolta em traições, abandono afetivo e uma frieza emocional brutal.
Neste capítulo, a morte é tratada não como fim, mas como um novo estado de consciência. A escrita flerta com o sobrenatural, com tons góticos e espirituais, lembrando autores como Poe e Márquez, ao mesmo tempo em que carrega um senso de justiça tardia – quase kármica. A vingança aqui não se realiza com violência gratuita, mas por meio de uma lógica transcendental onde cada ato encontra seu peso no além.
Destaque para a construção lírica e filosófica da narrativa, que desafia as noções comuns de tempo, moralidade e existência. A voz do narrador morto é serena, mas carregada de ironia e desencanto. As imagens criadas – como a morte do pai durante a ceia natalina, ou o corpo caído em posição de cópula sobre o amante da mãe e seu melhor amigo – são poderosas, perturbadoras e simbólicas.
O Retorno de Alice não é apenas uma continuação; é um manifesto contra os fantasmas reais da sociedade, e um convite ao leitor: para além do medo da morte, existe a necessidade de encarar os mortos-vivos do passado. Aqueles cujas almas clamam por escuta.
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