Mês: abril 2023

A arte e o desafio de ser escritor

A arte de contar histórias por meio de palavras é algo apaixonante e desafiador e que nem sempre recebe o reconhecimento necessário.

Quem é escritor iniciante sabe disso, por lidar com as dificuldades de se publicar um livro

Em reportagem veiculada prela TV Anhanguera de Goiânia, o escritor Orlando Rodrigues apresenta seu depoimento.

Apesar de ter o gosto pela escrita desde criança, reconhecer-se como escritor só aconteceu nos últimos dois anos, influenciado pelos reflexos da pandemia.

Com mais de uma dezena de livros publicados de modo independente, através de editoras não tradicionais, o autor vem buscando espaço no meio editorial e com isso obter o reconhecimento.

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O relicário

O relicário.

            A última pá de terra fora lançada sobre o caixão de Madame Laila, uma poderosa mulher cuja vida sempre fora dedicada ao ocultismo e magia negra, missão herdada de seus antepassados por mais de seis séculos, a partir de um tratado escrito em pergaminho, guardado secretamente por todos aqueles que foram se sucedendo na missão.

            Estabelecido estava que o tratado não poderia se quebrar, devendo ser passado de pai para filho ou de mãe para filha, assim obrigatoriamente, caso contrário, uma maldição se abateria a qualquer estranho que dele tomasse posse.

            De geração em geração, ao longo dos séculos, o tratado seguiu sendo repassado e herdado da forma promulgada, guardado em sigilo dentro de um pequeno relicário feito em bronze, contendo um pequeno canudo de papel, amarrado com um fino cordão embainhado em ouro.

            Madame Laila foi a última da geração de herdeiros do tratado, o qual não havia mais a quem ser destinado, a não ser por algum posseiro ou posseira qualquer, de qualquer canto do mundo e assim seria lançada a maldição de mais de seiscentos anos ou, exatamente, seiscentos e sessenta e seis anos.

            Assim estava escrito sob a forma de linguagem cifrada, com uso de anagramas e linguagem scabreux, significando algo difícil, escabroso e perigoso dissera o seu advogado, ao recolher as peças de sua casa que seriam ofertadas em leilão para admiradores de madame Laila horas depois de seu sepultamento, desejosos de se apropriarem de seus pertences como forma de lembrança.

            O riso foi geral, contrastando com o ambiente que deveria ser de tristeza.

            “Isso é lenda doutor. Madame Laila era uma mulher de Deus.” Disse um homem, político famoso e bastante religioso, a quem havia sido garantido por ela, a sua reeleição, fato que o livraria de inúmeros processos judiciais por diversos crimes, entre eles pedofilia e corrupção.

            “Não acredito nessas coisas.” Alardeou uma mulher, rindo em zombaria, ao lado de uma amiga, também aos risos, a qual eram vistas sempre abraçadas, com seus vestidos extravagantes e chamativos, em inúmeros eventos festivos ou chorosos, como aquele.

            “O doutor diz isso porque quer ficar com essa caixa de lata que para mim não tem valor algum.” Falou baixinho, quase um cochicho, em um canto da casa, uma mulher magrinha, de rosto envelhecido, que cuidava da limpeza de toda a casa, seu mobiliário e seus objetos de decoração, segurando um espanador, sem que ninguém a ouvisse ou a percebesse ali.

            E assim muitos outros, também em tom de zombaria, questionavam o tal advogado, já em julgamentos a ele, por considerarem o mais interessado naquela relíquia.

            Muitos foram os argumentos e as discussões, as trocas de insultos entre eles, as ofensas e maledicências, cuja contrariedade apenas aumentava, assim como aumentavam os insultos, a raiva e o ódio, sem que ao menos tentassem, antes de tudo, desvendar o que de fato haveria naquele relicário e quais os seus dizeres.

            Se boato ou não, a fé e a descrença se debatiam em torno de algo que ninguém conhecia de verdade, apenas, tão somente, por ouvirem dizer, da boca daquele advogado.

            Os ânimos se acaloraram até partirem para a agressão corporal, cada vez mais violentas e sanguinárias, cada qual usando sua melhor arma para se livrar do oponente, fosse com as mãos, por meio de estrangulamento, golpes de faca, cortando traqueias, rasgando abdomens ou tiros, perfurando cabeças, peito ou estourando miolos, lançados em sangue à várias partes da casa, transformando o ambiente em um cenário de terror e morte, a exceção da não notada mulher magrinha que apenas observava tudo em silêncio e com horror.

            Em poucos minutos foram caindo todos, uns sobre os outros, cobrindo todo o chão da casa por um rio de sangue a correr, como um rio vermelho.

            Sobrevivente, sem entender a razão de tudo aquilo, a mulher magrinha abriu a pequena caixa de bronze, o relicário com o papiro e suas inscrições. Junto ao papiro, um pequeno bilhete com uma curta mensagem. “Está em suas mãos prosseguir a missão.”

FIM.

Orlando Rodrigues

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Vampiros dormem cedo

Vampiros dormem cedo.

E ao primeiro raiar de luz solar, após uma tenebrosa caçada noturna, ocupei-me de dirigir-me aos meus aposentos, embora ainda sedento de sangue virgem, o elixir vigoroso de minha vida eterna, atravessando séculos por todo o mundo.

Devo confessar que essa coisa de vida eterna tem seus percalços, afinal o mundo dos mortais é excessivamente inquieto e, ao longo dos séculos, eu pude observar as transformações.

Ser vampiro em pleno século XXI é bastante diferente de ser vampiro no século XVIII por uma série de razões e a primeira e mais importante para mim, um vampiro, está no fato de poder vagar solitariamente pelas noites para encontrar sangue virgem.

Como era prazeroso fazer isso naquela época em que eu saía ao primeiro crepúsculo da noite, vagando por estreitas ruas escuras à caça de jovens, sobretudo, as donzelas de sangue virgem que passavam noites acordadas, sonhando com príncipes encantados ou algum conde bem aparentado, rico, charmoso e sexy.

Assim eu me apresentava às donzelas notívagas que se reviravam em suas alcovas, ardendo em febre de sexo, desejando serem tocadas, acariciadas, beijadas em seus corpos juvenis, repletos de energia.

E elas me recebiam em seus devaneios, tornando as noites sempre longas e intensas e me agasalhavam em seus corpos para que eu pudesse sugar todo o sangue que corria em suas veias.

E quanta energia eu tinha para sugar-lhes todo o sangue em cada centímetro de seus corpos para revigorar-me e partir ao primeiro raio de sol ainda tímido que surgia no horizonte.  

Assim fui vivendo séculos e séculos, acompanhando as transformações causadas pelo tempo e sua evolução, às custas da modernidade, até chegar às noites de hoje, uma extensão de todos os dias claros das manhãs e tardes de sol, onde as pessoas parecem não dormir.

As noites já não são mais escuras e parecem terem ficado mais curtas, com pessoas acordadas indo e vindo pelas ruas já não tão estreitas, iluminadas de muitas cores.

Eu tento encontrar as jovens donzelas de sangue virgem, mas não as vejo.

As que encontro, parecem não terem mais sangue, ou seu sangue já não é mais virgem, embora muitas delas continuam notívagas, mas não esperam príncipes encantados e muito menos condes, como eu.

E as noites claras de luzes multicoloridas intensas se vão numa rapidez que me amedronta, me assusta e roubam toda a minha energia sem que eu tenha a oportunidade de me reabastecer.

Os dias sem dormir vão se acumulando e eu sinto perder a minha vitalidade, noite após noite, não me restando outra alternativa a não ser me recolher como sempre, séculos e séculos, ao primeiro raiar do dia. Vampiros dormem cedo.

A sensação que tenho é que meu sangue, já enfraquecido pela energia que roubam de mim, nas noites alucinantes de baladas que nunca tem fim, está secando.    

Mais uma noite se findou e eu nem percebi, por não poder vagar pelas ruas em meio aos carros velozes, barulhentos e iluminados, e eu não encontrei sangue virgem.

Vampiros dormem cedo, ao primeiro raiar do dia. Retornei ao meu aposento e à minha alcova secular, decidido a dormir um sono profundo, desejoso de que as trevas estejam prestes a se abater por toda a humanidade e assim eu poder retornar.

Orlando Rodrigues

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Vizinha do 201: a aparição.

A vizinha do 201.

Um microconto de Orlando Rodrigues.

Já havia se tornado uma rotina a sua aparição à janela da sacada de seu prédio, bem do outro lado da rua, de frente para a janela de meu quarto, sempre no mesmo horário, às dezesseis horas em ponto.

No início eu nem dei importância para o fato, uma vez que eu saía de meu banho de todas as tardes, sempre nesse mesmo horário, após chegar de meu trabalho em um grande banco.

Mas, o fato começou a se repetir cotidianamente, militarmente, sempre no mesmo horário e da mesma forma. A aparição da vizinha, uma jovem e bela mulher, que se debruçava sobre o guarda corpo de vidro da sacada de seu apartamento. Ela olhava fixamente para a minha casa e diretamente para mim, desafiando a minha mania de sair nu do banheiro e desfilar sem roupa pelo quarto com a janela aberta.

Morar sozinho me outorgava esse direito de ficar inteiramente nu no meu quarto e com a janela aberta. Afinal, quem não quer ver estrelas que não olhe para o céu. Quem já viu não se assusta e quem não viu não sabe o que é, portanto, ficar pelado no meu quarto era problema meu.

De fato, se tornou um problema, pois acabei me apaixonando pela moça da janela cuja aparição ocorria em trajes íntimos ou mesmo totalmente nua, sorria pra mim e acenava. Por meses foi assim, até que um certo dia ela resolveu falar comigo e me convidou para ir a seu apartamento de número 201.

Eu estava apaixonado e excessivamente encantado por ela, cheio de desejos, a ponto de algumas noites ter sonhos eróticos com ela. Não titubeei, vesti uma roupa, passei um perfume em várias partes de meu corpo, saí de minha casa e atravessei a rua. Toquei a campainha do interfone e ouvi o estalo do acesso concedido. Subi rapidamente as escadas do prédio sem elevador e apitei ofegante e já bastante excitado, a campainha do apartamento. A porta abriu. Entrei. Caminhei pela casa chamando pela moça a quem eu não sabia o nome. Adentrei a cozinha, sala, banheiro e o único quarto do apartamento e não a vi. Chamei, chamei, chamei. Abri portas de cômodos e armários e não a encontrei.

Saí do apartamento da moça estranhando a situação, pensando que ela pudesse ter ido ao meu encontro e nos desencontramos. Ao sair dei de cara com o zelador do prédio que, percebendo minha aflição, perguntou o que eu desejava. Perguntei pela moça que morava ali naquele apartamento. O zelador olhou fixamente em mim, passou rapidamente os olhos pelo apartamento que estava com a porta semiaberta e me revelou em tom sinistro.

          “A moça não mora mais aqui. Ela morreu já tem uns quatro meses. O senhor é parente dela?”   

Orlando Rodrigues

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A vizinha do 201